‘Pantanal está sufocando’: queimadas já consumiram área equivalente a 680 mil campos de futebol

Animais são encontrados carbonizados, desnutridos e assustados com incêndios na região

Desnutridos, assustados e até mesmo carbonizados. É assim que muitos animais estão sendo encontrados durante os incêndios que atingem o Pantanal em um dos períodos mais desafiadores para a região. “Estamos vendo o Pantanal sufocando”, descreve ao Terra o biólogo Sérgio Barreto, do Instituto Homem Pantaneiro (IHP), que atua diretamente na linha de frente contra essas queimadas. 

Desde 2019, o Pantanal, que é considerado um dos biomas mais importantes e preservados do Brasil, sofre com grandes incêndios, fora de controle e de intensidade devastadora. De acordo com o Ministério Público do Estado do Mato Grosso, neste ano, uma área equivalente a 680 mil campos de futebol já foi consumida pelo fogo no bioma que é conhecido pelas áreas alagáveis –que também estão secando. 

“O fogo chegou antecipado este ano”, relata Barreto. Embora o fogo seja parte dos ciclos naturais do Pantanal, a intensidade e a frequência dos incêndios aumentou significativamente nos últimos anos.

Esses incêndios afetam não apenas a biodiversidade, mas também a população local, incluindo comunidades tradicionais e ribeirinhas. Barreto descreve um cenário onde “a cidade de Corumbá ficou encoberta por semanas de fumaça”, trazendo problemas respiratórios para os moradores e causando um impacto profundo na fauna pantaneira.

O IHP, junto com outras organizações, realiza um monitoramento rigoroso na região da Serra do Amolar, uma área de aproximadamente 300 mil hectares. Barreto explica que o monitoramento é feito por meio de câmeras 360 graus, operando 24 horas por dia. “Esse monitormante nos dão uma resposta em até três minutos sobre a origem de um incêndio, permitindo uma resposta rápida e eficaz. Graças a esse sistema, a Serra do Amolar tem conseguido evitar focos de incêndio, embora outras áreas, como o entorno de Corumbá, tenham sido severamente afetadas.”

Após a passagem do fogo, equipes de resgate entram em ação. “Temos uma janela de 24 horas para realizar um levantamento da área e buscar animais feridos ou necessitados de auxílio”, conta Barreto.

Bombeiros voluntários, membros da Brigada do Alto Pantanal andam por área queimada enquanto trabalham para extinguir o fogo no Pantanal, em Corumbá (MS) – 14/06/2024. Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino.

Essas equipes são compostas por biólogos, veterinários e técnicos de campo, que avaliam se os animais precisam de captura para tratamento ou apenas de suporte nutricional no local. “Muitas vezes, o fogo consome todo o recurso alimentar dos animais, deixando um solo arenoso e esfarelado, coberto de cinzas”, explica ele.

A fauna local sofre imensamente com os incêndios. Barreto descreve cenas trágicas onde répteis como jacarés e lagartos são encontrados carbonizados. Famílias de primatas, como bugios e macacos da noite, perdem seu habitat e recursos alimentares, necessitando de suporte nutricional diário para sobreviver. “Esses animais não têm queimaduras, mas morrem de fome se não receberem ajuda”, lamenta o biólogo.

Neste período, o biólogo destaca que o Pantanal deveria estar repleto de vida e sons vibrantes das aves migratórias em reprodução.

“Essa época agora, pelo Pantanal, é a época da reprodução das aves migratórias. A gente tá num período de vazante que era pra ser um dos períodos mais ricos do Pantanal de observação de aves”, explica. No entanto, o cenário atual é bem diferente. “Quando chega agora no Pantanal, você escuta somente o som de aviões e helicópteros jogando água. O Pantanal está um silêncio, um silêncio estontecedor, parece um cemitério”, lamenta.

Barreto ainda descreve a devastação que encontrou: “Além de um cemitério de carcaças de animais mortos que a gente acaba encontrando, é aquele silêncio de cemitério. Um Pantanal mudo, um Pantanal sem voz, sem som, sem a música do Pantanal que são os sons das aves”.

Equipe do IHP atua na linha de frente para salvar fauna ameaçada pelo fogo no Pantanal. Foto: Divulgação/IHP

Essa ausência de vida traz uma sensação profunda de impotência, segundo ele. “Isso nos traz uma sensação às vezes de impotência mesmo. Será que o que eu tô fazendo é o suficiente? Será que o que eu tô fazendo faz resultado? E isso realmente dói. Os animais tentam respirar e só aspiram fumaça e fuligem, e esses animais acabam se chocando contra a parede por desorientação e por problemas respiratórios”, relata o biólogo.

Barreto compartilha a tristeza ao encontrar famílias de macacos carbonizadas, todas em posição fetal: “Eles entram na posição fetal e morrem carbonizados. Normalmente, você encontra o bando inteiro, todos juntos, carbonizados e em posição fetal”. Essas cenas, segundo ele, não saem da mente de sua equipe, que frequentemente precisa de apoio psicológico após atuar em áreas de desastre.

Para amenizar a devastação ambiental, o biólogo enfatiza a importância da cooperação entre bombeiros, instituições federais e estaduais, e a comunidade local. “Precisamos que todos os atores falem a mesma língua para respostas mais rápidas e assertivas”, afirma. De acordo com o profissional, há urgente uma necessidade de educação ambiental para ensinar a população local sobre o uso controlado do fogo: “100% dos incêndios recentes foram causados por ação humana. Precisamos educar as pessoas sobre os riscos e como evitar essas situações.”

Na última terça-feira, 16, a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança do Clima, afirmou que 56% dos focos foram extintos.

Fogo é ameaça às espécies animais que vivem na região. Foto: Divulgação/IHP

Instituto Homem Pantaneiro

O Instituto Homem Pantaneiro (IHP) é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, criada em 2002 em Corumbá (MS). Sua missão é proteger e conservar o bioma Pantanal e preservar a cultura local.

A atuação do IHP inclui a gestão de áreas protegidas, apoio e desenvolvimento de pesquisas científicas, além de promover o diálogo entre diversos interessados na preservação do Pantanal.

O Instituto desenvolve programas permanentes, como a Rede Amolar, Cabeceiras do Pantanal, Amolar Experience, Felinos Pantaneiros, Memorial do Homem Pantaneiro, Brigada Alto Pantanal e Estratégias para Conservação da Natureza. Essas iniciativas visam prevenir incêndios, criar corredores de biodiversidade e apoiar o desenvolvimento das comunidades locais.

Informações: Terra.

Se inscrever
Notificar de
guest

0 Comentários
Feedbacks
Ver todos os comentários

ÚLTIMAS NOVIDADES

+55 67 99227-8719
contato@maisfloresta.com.br

Copyright 2023 - Mais Floresta © Todos os direitos Reservados
Desenvolvimento: Agência W3S