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O uso da biomassa florestal como fonte energética no Brasil

Artigo de Marcelo Schmid, CSO do Grupo Index.

A energia de biomassa representa atualmente menos de 10% da capacidade instalada de energia elétrica no país, apesar de ser a terceira forma de energia mais competitiva no Brasil perdendo apenas para a energia eólica e para as centrais geradoras hidrelétricas.

Entre as fontes de biomassa utilizadas, destaca-se o bagaço da cana-de-açúcar como a principal delas, seguida do licor negro (bastante utilizado pelas fábricas de celulose) e, em terceiro lugar, os resíduos de origem florestal.

Muito embora o setor florestal tenha se agitado por anos diante da oportunidade de fazer do mercado de energia um novo e importante nicho para produtos de base florestal, até então nosso setor se depara sempre com os mesmos gargalos: baixa viabilidade (ou inviabilidade) de projetos florestais dedicados, falta de suprimento diante da demanda crescente por madeira, que leva à competição com mercados muito maiores, que não estão dispostos a perder suprimento para os rivais, como a celulose. 

Por outro lado, mesmo com todos os desafios na mesa, sabemos que a demanda energética do Brasil é constante e que a matriz energética precisa de diversificação, para que não tenhamos que enfrentar novamente o perigo de um apagão. Soma-se à demanda nacional, a pressão mundial pela redução das emissões de gases de efeito estufa, tornando a energia de biomassa florestal uma opção interessante.

Mas se há demanda de mercado e anseio da sociedade, como superar as barreiras que impedem o desenvolvimento da energia de biomassa florestal? Será que não está na hora de se pensar mais criativamente e parar de fazer mais do mesmo? Um sistema adequado e criativo de gestão de suprimentos pode certamente resolver ou minimizar as dificuldades, mesmo nos mercados mais competitivos! 

Ao invés de depender somente de plantios dedicados, que tal combinar um volume menor de plantios com aquisição de biomassa de outras fontes disponíveis no mercado, tirando vantagem da sazonalidade (e preço) de cada produto? A tecnologia das caldeiras permite tirar vantagem do uso diversificado de biomassa, então porque não explorá-la?

Ao invés de competir com grandes players pela floresta, que tal deixar os troncos das árvores para eles e explorar energeticamente resíduos, casca, tocos, e galhadas? Temos exemplos de países que estão utilizando resíduos florestais com excelência, alguns desses, países com muito menos tradição florestal que o Brasil!

A biomassa está em uma região de grande competição por madeira, altamente industrializada? Melhor ainda, pois nesse ambiente diversificado há grande volume de geração de resíduos, pequenos e médios produtores, negócios paralelos, vantagens logística, ou seja, diversas oportunidades que permitirão criar uma rede de fornecimento sustentável. 

A gestão adequada e dinâmica é a solução que empresas modernas estão utilizando para sobrepor os desafios do mercado de energia de biomassa. Para que colocar todos os ovos na mesma cesta? A resposta para tornar a energia de biomassa florestal viável, pode estar justamente não na floresta, mas em volta dela!

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Carro elétrico plugado no apagão florestal

Artigo de Sebastião Renato Valverde[i], Gabriel Browne de Deus Ribeiro[ii] e Emanuelly Canabrava Magalhães[iii]

Ao se depararem com o atual avanço do mercado de carros elétricos no mundo, muitos nostálgicos brasileiros devem estar se contorcendo de raiva em saber que o Brasil já teve uma marca de carros 100% nacional e que, em 1980, lançava seu primeiro carro a eletricidade, o Gurgel Itaipu, quando ainda no mundo pouco ou nada se cogitava a respeito. No entanto, assim como todas as indústrias tecnológicas brasileiras são subjugadas a própria sorte, ele sucumbiu aos motores à combustão das multinacionais americanas e europeias. As mesmas que hoje sofrem a concorrência dos carros elétricos asiáticos.

Independentemente da guerra comercial entre os países players na produção dos carros elétricos com os players dos à combustão e dos benefícios louváveis destes carros para o planeta e para a sociedade, sobretudo ao bolso dos seus proprietários, há muita água para jorrar nas hidroelétricas e nem tudo é doce neste céu de brigadeiro, pois tem chocolate amargo também, cabendo reflexões sobre alguns pontos nebulosos e sobre potenciais oportunidades florestais.

Apesar de possíveis controvérsias, de antemão cabe reforçar o exposto acima de que, mesmo sendo positivo este inexorável aumento do mercado, principalmente para o meio ambiente, suscita preocupações que merecem análises para elaboração de políticas proativas que minimizem possíveis danos ou perdas para a economia do país e de proposição de estratégias favoráveis para o setor florestal se locupletar das oportunidades deste pujante mercado.

Indiscutivelmente as maiores vantagens do carro elétrico estão na economia de combustíveis e de despesas com a manutenção mecânica e nos benefícios ambientais dada a eliminação das emissões dos gases de efeito estufa (GEEs).

Vale destacar que além dos proprietários de veículos elétricos e híbridos (combo de motor a combustão com elétrico) serem beneficiados pela economia dos combustíveis, indiretamente, os donos de veículos a combustão também são favorecidos com a possibilidade de menor pressão sobre o valor do petróleo com a diminuição proporcional da demanda deste. À medida que as vendas dos carros elétricos avançam em detrimento daqueles, implica em menor demanda de combustíveis, aliviando a pressão para aumento no preço do petróleo e destronando a tão temida força cartorial dos países da OPEP.

Uma vez que o petróleo é não renovável, faz-se interessante lembrar que na década de 1970 os catastrofistas alarmavam-se de que só restavam mais 50 anos de vida dele e que, com sua escassez, o valor ficaria inviável para locomover a frota mundial de carros, caminhões, trens, navios, aviões, etc. Hoje poucos arriscam em profetizar o caos no preço dos combustíveis com o fim do petróleo já que isto assusta tanto quanto os bruxos nas crianças no halloween, ou seja, nada. Pois bem, passaram-se este meio século e a preocupação com o fim dele é marginal, haja vista a evolução nos meios de transportes coletivos e de carga, na eficiência dos motores a combustão e híbridos, nos combustíveis alternativos como o etanol, biodiesel e GNV, e até mesmo a solidificação do trabalho remoto corroborado com a pandemia do covid, possibilitando menor deslocamento das pessoas aos postos de trabalho.

Entretanto, aqui começa algumas das preocupações com o crescimento do mercado de carros elétricos. Primeira delas, trata-se da sobrevivência dos combustíveis alternativos, principalmente no Brasil que se consolidou com os renováveis como o etanol nos motores flex e o biodiesel. A segunda é com a continuidade das pesquisas das novas tecnologias de produção de biocombustíveis com enorme potencial de substituição do diesel por meio da fast pirólise da biomassa na produção do bio-óleo e dos gases. Estas não podem ter o mesmo destino do Gurgel Itaipu. A terceira, aos impactos dele nos empregos nas oficinas mecânicas, dado que estes veículos têm 1/5 de peças do a combustão, em media 60 e 300, respectivamente. Por sorte eles também têm sistema de direção (volante, mesmo que sejam carros autônomos), de segurança (freios e suspensão), elétrico (farol, setas, lanternas) e todo kit de eletrônica e entretenimento embarcados que demandam consertos, reparos e substituições nas oficinas mecânicas e auto elétricas.

Um quarto ponto que incomoda diz respeito a geração da eletricidade e do impacto sobre a oferta e o preço dela. A começar pelo Brasil, como ficará o abastecimento destes automóveis caso haja risco de colapso na oferta de eletricidade? Tivemos momentos no Brasil, 2000 a 2002, com os apagões elétricos que suscitaram, por bem na estrutura de governança da ANEEL, mas na instalação de várias termoelétricas a combustíveis fósseis vindo a aumentar exponencialmente a conta de luz para as indústrias e residências. Além disso, tivemos de 2010 a 2014, os potenciais apagões que fizeram com que o MWh chegasse a R$840,00 no PLD (Preço de Liquidação das Diferenças), levando muitas empresas a lucrarem mais com as portas fechadas, vendendo a energia pré-adquirida.

Ciente que atualmente o valor do MWh está acessível em razão do baixo crescimento econômico desde 2015 e que o valor do consumo nos elétricos é menos que um terço do outro, mas que, com reais e necessárias possibilidades de recuperação da economia acima de 3% ao ano pode vir a ter novamente os blackouts. Assim, com o aumento do mercado de veículos elétricos e sua total dependência da eletricidade, questiona se haverá disponibilidade de energia para todos os consumidores residenciais, industriais, transporte, etc.? Paradoxalmente, por sorte, o nível de preço dos carros elétricos ainda está longe do padrão de renda dos consumidores brasileiros e que este avanço ocorrerá dentro de prazos módicos sem comprometer, talvez, o fornecimento de energia. Exceto no período de seca quando passa a vigorar a fatídica bandeira vermelha na conta de luz elevando o preço do MWh às nuvens.

As preocupações seguintes referem-se às questões ambientais que extrapolam os limites do território brasileiro. Considerando que em breve as vendas dos carros elétricos na Europa ultrapassarão os a combustão e que naquele continente o carvão mineral, principal insumo energético, ultra poluidor e responsável pelas maiores emissões de GEEs, será que o balanço entre a redução das emissões será favorável em relação ao aumento no consumo deste mineral? E mesmo sendo favorável, não comprometeria os compromissos assumidos pelos países desenvolvidos de redução total até 2050?

Ainda que o saldo das emissões dos GEEs seja favorável pela substituição dos derivados do petróleo pelo mineral, o certo é que, se os países ricos querem levar a sério os acordos das COPs de reduzir o consumo dele, deveriam, pelo menos para não ficarem só no campo da retórica, substituírem o plus a mais para atender a demanda dos carros elétricos pelos briquetes do biochar e pellets, nem que seja do torrificado. Nestes aspectos, surgem significativas oportunidades para o setor florestal.

A expectativa de aumento no consumo de eletricidade implicará na necessidade de aumentar a oferta de energia, seja no parque eólico, nas fazendas solares, nas termoelétricas, tanto a combustíveis fósseis quanto a biomassa, para compensar a oferta de hidroenergia que tende a saturação. Com o aumento na produção de energia solar, maior será a demanda de painéis de silício metálico a carvão vegetal nas fazendas solares e, por que não, no ritmo do progresso tecnológico, nos tetos dos futuros ônibus e caminhões baús autopropelidos.

Pensando nas nossas indústrias de ferroligas e silício metálico a este bioredutor, temos as oportunidades de utilizar estas ligas especiais nos carros elétricos para tornar seus motores e baterias mais leves, resistentes, duradouros e mais baratos, haja vista que elas são caríssimas (chegam a custar até R$60.000,00), pesadas e durabilidade desproporcional ao seu valor. Nem abordar neste texto a questão da deposição destas baterias enquanto lixo.

Raciocínio análogo é da oportunidade de energia termoelétrica a biomassa florestal seja pela geração direta nas usinas ou pela cogeração nas caldeiras das indústrias de transformação exportando os excedentes elétrico para o grid, sobretudo com a expectativa de aumento do valor do MWh acima do break even point dela que gira em torno de uns R$330,00/MWh.

Enfim, confirmando estas expectativas no aumento da produção de biocombustíveis, de eletricidade e exportação de briquets e pellets, haverá pressão para aumento nos preços da madeira de forma duradoura provocando tendências ao tão desejado e amado “apagão florestal” para tornar atrativo e seguro o investimento em reflorestamento para os novos produtores independentes porque os velhos, de tão frustrados, nem a preço de ouro na madeira, investirão. Que venha o apagão florestal nem que seja no curto-circuito do carro elétrico.


[i] Professor Titular do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa (DEF/UFV), valverde@ufv.br

[ii] Professor Adjunto do Departamento de Ciências Florestais e da Madeira da Universidade Federa do Espírito Santo (DCFM/UFES), gabriel.d.ribeiro@ufes.br

[iii] Doutoranda em Ciência Florestal na Universidade Federal de Viçosa (UFV), emanuelly.magalhaes@ufv.br

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Sustentabilidade na indústria madeireira: rumo a práticas responsáveis

Artigo de Fábio Nardelli – Diretor comercial da Oregon Tool.

A indústria madeireira, crucial para diversas aplicações econômicas, enfrenta uma pressão crescente para redefinir suas práticas à luz dos desafios ambientais. Nesse contexto, destacamos a necessidade de um compromisso unificado em direção à sustentabilidade e à adoção de práticas ESG (Ambientais, Sociais e de Governança) para mitigar impactos negativos.

No centro dessa transformação está a urgência de repensar a origem de nossos recursos florestais. A transição para fontes certificadas e manejo florestal sustentável é imperativa. Certificações reconhecidas internacionalmente, como o Forest Stewardship Council (FSC), oferecem uma estrutura para assegurar que as operações madeireiras estejam alinhadas com os mais altos padrões de sustentabilidade.

A inovação torna-se um aliado estratégico nessa jornada. Investir em tecnologias avançadas não só melhora a eficiência da produção, mas também possibilita a redução do impacto ambiental. Processos mais eficientes e o uso responsável dos recursos tornam-se peças-chave para promover uma indústria madeireira verdadeiramente sustentável.

Responsabilidade social é outro pilar crítico. O reconhecimento do impacto nas comunidades locais e o compromisso em contribuir positivamente para o seu desenvolvimento são essenciais. Programas educacionais, de saúde e capacitação profissional não apenas fortalecem as comunidades, mas também constroem uma base sólida para uma indústria madeireira responsável.

Além disso, a transparência e a governança corporativa eficaz são fundamentais para ganhar a confiança das partes interessadas. A prestação de contas regular sobre os progressos e desafios no caminho da sustentabilidade reforça o compromisso com a melhoria contínua e a responsabilidade perante a sociedade.

Em síntese, a transformação sustentável na indústria madeireira é um caminho necessário. A busca por fontes certificadas, a inovação nos processos produtivos, o compromisso com as comunidades locais e a transparência são elementos críticos para garantir que a indústria possa prosperar sem comprometer o meio ambiente e as gerações futuras. Nessa jornada, é fundamental que todas as partes envolvidas compartilhem um compromisso coletivo para moldar um futuro mais sustentável para a indústria madeireira e para o planeta.

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Eu sou FLORESTAL mais que UNIVERSAL

Artigo de Sebastião Renato Valverde.

Quem me vê assim forte, grande, limpo e inodoro, maior e melhor que um nórdico, não imagina o quanto fui pequeno, fraco, sujo e fedorento, menor e pior que o grego do pergaminho. Fiquei grande e “bombadão”, mas sem o uso de anabolizante de cavalo e sem frituras. São muitos investimentos em academias e na minha dieta que, embora eu coma muito e ininterruptamente, ela é diet, zero óleo e gordura, vegana, sendo somente a base de um picadinho bem cozido e com sal a gosto para não ficar hipertenso, senão, posso explodir e matar todos ao redor.

Já tive época que eu parecia um panda de tanto comer bambu. Até que um dia, além de perceber que não engordava, senti uma corrosão no meu sistema digestivo, com dificuldade de mastigar e defecar. Daí me recomendaram a comer fibras mais curtas, então mudei a dieta radicalmente e passei a ingerir só madeira, como um cupim, só que gigante. Tornei-me mega obeso e, paradoxalmente, mais eficiente. Há quem aposte que em breve serei um combo de panda com cupim.

Já não tinha suco gástrico no estomago, era mesmo soda cáustica para dar conta de degradar tanta fibra dura e em grande quantidade. Além disso, depois de tanto picar e comer bambu, devido à sílica, meus dentes já estavam todos gastos. Tive que fazer implantes. Aproveitei e já implantei dentes de aço especial, inoxidável, salpicado com ferroligas de cromo e titânio a carvão vegetal.

Mesmo tendo evoluído, crescido e fortalecido, sempre me deparei com a vida aumentando o sarrafo para saltos mais altos a cada novo desafio. Reconheço que devo isso muito aos “verdes olivas” que, na década de 1970, me incentivaram a crescer, e aos de black ties após 2000 que me oportunizaram a ganhar o mundo.

Embora às vezes fosse prazeroso vencer os obstáculos, tiveram momentos que foram sofridos superá-los, mesmo assim procurei produzir com gosto as coisas que ajudassem a educar a sociedade, torná-la mais culta e mais limpa, seca e higienizada, deixando tudo embrulhadinho. No início não foi fácil. Desde cedo tive que enfrentar sozinho os obstáculos da vida, tanto para comer como para produzir. Pois, ainda recém-nascido e órfão não tive quem me alimentasse. Sempre renegado, as pessoas achavam demorado, caro e arriscado produzir o meu sustento dado as características do meu prato predileto. O que repelia a minha adoção.

Em que pese muita responsabilidade precoce, enquanto criança não deixei de fazer minhas travessuras que eram tratadas com certa naturalidade pelas pessoas. No mesmo rio que eu bebia água, descarregava o esgoto, defecava e urinava. Flatular era o meu forte. Na verdade, ainda o é, só que hoje consigo dissimular o barulho e disfarçar o cheiro de ovo podre borrifando essências florais na ponta do orifício. Embora ainda há quem goste deste cheiro alegando aroma da verdinha.

Ainda que poluído, era comum o gado pastar na beira do rio e, por incrível que pareça, ficava liso de gordo. Também pudera, parte da minha descarga era sal puro e quanto mais ele pastava e bebia, mais água tinha que beber. Hoje tais áreas viraram APPs que estão protegidas com as águas mais limpas e sem o gado. Sendo que este, já fora da APP, não mais liso, porém sadio.

Para compensar as travessuras de criança, hoje eu protejo as margens dos rios, as nascentes e os morros, além de manter uma grande área de mata para os bichos poderem correr, caçar e procriar.

Apesar de no passado eu não ter tido tanta dificuldade de gerar minha renda para sustento, pois era acessível coletar, vender e reciclar papel e fabricá-lo em pequenas quantidades, não havia tanta concorrência, inclusive, muito do que se tinha de papel no Brasil vinha de outros continentes.

Como ninguém me adotava, restou a mim mesmo, com muita dificuldade, produzir meu alimento. No início plantava em todo o meu quintal. Bicho nele era só inseto, réptil e anfíbio. Raramente paca, capivara e anta davam as caras por lá. Agora, como minha fome é enorme, tive que expandir meu quintal à décima potência e o que tenho de plantio, tenho de mato. E aí, haja mato e haja bicho grande e feroz. É tanto mato que tem onça aos montes. Quando elas deparam com os homens, até assustam. Também, pudera, um monte de homens feios no mato. Já, as mulheres mateiras, estas sim são deusas, mas aqueles, quanta diferença, quantos shampoos Colorama.

Sempre fui diferente dos meus vizinhos na roça. Enquanto eles produziam arroz, feijão, milho, verduras e legumes, eu produzia bambu e depois pau. Me achavam louco em produzir algo que demorava tanto tempo e numa época que havia tanto pau nas matas.

Até então, a sociedade aceitava, achava normal eu fazer xixi e kh no rio e flatular. Mas, com o tempo ela me pressionou dizendo que eu não mais poderia urinar, defecar e nem flatular. Eu poderia beber a água do rio, mas urinar só se a qualidade da urina fosse igual ou melhor que da água consumida. O resíduo sólido, nem pensar. Me obrigaram a tratar dele. Tive que fazer uma fossa séptica gigantesca, uma verdadeira estação de tratamento de esgoto.

Assim, para atender as exigências da sociedade, tive que crescer para sobreviver. Era crescer ou morrer. Preferi crescer. Crescer para produzir mais para que meus custos fixos caíssem pela quantidade produzida. Cresci, gigantiei-me. Não mais vendi produtos diretamente para a sociedade que as tornava cultas, limpas e embrulhadas. Somente produzi para quem incumbisse disso.

Os colegas que não cresceram, morreram. Alguns mudaram de ramo, outros somente a reciclar. Os pequenos que continuaram tiveram que transportar todo xixi e cocô para grandes lagoas até sucumbirem. Só que, como um dia de domingo, umas delas rompeu e despejou todo rejeito fedorento rio abaixo até chegar no mar.

Embora ninguém produzisse o que eu consumia, pelo menos, ninguém criticava o que e como eu produzia. Hoje, tendo sido forçado a crescer, a me gigantear e não desperdicei as oportunidades que os verdes olivas e de black ties me deram – até porque sou adepto a frase de cavalo arreado só passo uma vez e tratei logo de subir nele – resolvi expandir. Mas, por ser grande, fiquei muito visível. Virei vidraça e aí, dá-lhe pedradas. Me criticam de tudo que faço, como faço, o que utilizo e também daquilo que planto, produzo.

Atualmente meu maior problema nem é tanto o ambiental, mas sim, social. Não consigo atrair produtores para me abastecer. Como no passado, tenho que investir em terras e plantios quando poderia direcionar só para a indústria. Desta forma, me restou, desde nascença, me verticalizar e ser proporcionalmente concentrado. Ainda que seja aparentemente mais confortável produzir meu próprio alimento, o custo disso é maior do que se produzido por terceiros que não querem, haja vista o longo prazo e o custo inicial alto de produzi-lo, além de ter poucos consumidores por perto, incerteza futura no preço, inflação e juros estratosférico. Daí preferem produzir grãos para o mercado internacional e que é de curto prazo e recebem em dólar, verdinha.

Assim, se já não me alimentavam quando pequeno, quiçá agora que sou gigante, faminto e bocudo e que para sobreviver, fui obrigado a produzir cada vez mais meu alimento. Fui comprando tudo que é propriedade em volta para manter a minha obesidade. Os terceiros desconfiavam que eu não sobreviveria à obesidade mórbida por isso não plantavam com receio de não terem para quem vender o alimento já que não tinha outro guloso por perto, dado que tais alimentos não se viabilizavam transportá-los a longas distancias.

Em que pese o alimento ser o mesmo de quando eu era pequeno só que com quantidade maior, as críticas vieram com força dizendo que eu seco e empobreço a terra, àquelas que já planto e colho bem a quase um século no quintal. Também alegam que eu afugento os bichos, sendo que as onças tão quase virando animais de estimação na minha roça. E olha que tem uma turma de gente que fica no meu pé para ver se estou socialmente justo, economicamente viável e ambientalmente correto. Uns tais de certificadores e competidores. Atendi a todas eles, mesmo exigindo de mim mais do que as legislações ambientais e trabalhistas. Como resultado disso e para me manter competitivo no Globo estou selado até à testa.

Consequentemente, pela característica do meu processo produtivo, jamais deixarei de ser verticalizado e concentrado. Poderei minimizar, mas deixar de ser, infelizmente, jamais. Além de não mais flatular, defecar e urinar no rio, consumo bem menos água pelo que, exponencialmente, produzo. Se no passado eu consumia em torno de 100m3 de água por unidade produzida, hoje são apenas de 20 a 30m3.

Enfim, evolui. Eu que já fui quase um escandinavo, superei-o. Hoje sou um Deus Grego suntuoso. Os meus concorrentes internacionais estão querendo pegar uma boquinha no Brasil pagando qualquer preço pelo meu passe e pelo dos meus concorrentes compatriotas. Espero que eu e nenhum deles se deixe seduzir pelo capital dos yankees ou de qualquer gringo e ceda o controle das nossas empresas.

Para quem ainda não me identificou e aos que não me conhecem, eis que não sou a Universal, mas, sim, a Indústria de Celulose Transnacional do Brasil, The Big and Best of the Universal.

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